Ela sabia que ia passar, mas até passar ia doer e mesmo sabendo que a dor uma hora ia cessar, ela não conseguia deixá-la agir. A luta para não sentir aquilo doía bem mais do que a simples conformidade sobre a ação dela. Continuar, seguir em frente, recusar o passado e pensar só no futuro.
– É claro que eu posso, dizia ela!
E ela podia. Podia lutar e se negar ao sofrimento, ela era forte. Mas o que ela devia saber é que se negar ao sofrimento não acaba com ele, só o deixa adormecido em algum lugar. Num desses lugares escondidos em que apenas as coisas ruins (aquelas bem ruins) se escondem.
E ela seguiu. Trabalhou o máximo possível. Manteve-se ocupada até quando não era preciso estar. Leu muito. Estudou mais ainda. Se afastou de todos que podiam de alguma forma lembrar o passado tão dolorido. Fez novos amigos. Novos lugares para ir. Novas pessoas pra conhecer. Ouviu música, mas não as tristes, só as alegres. Conheceu lugares inusitados. Escreveu para os velhos amigos. E se perdeu dos velhos amigos.
– O mundo é cheio de infinitas possibilidades, dizia ela.
E é. E ela sabia. E sentiu isso todos os dias. Era fácil driblar a dor quando há muito a ser feito, mas às vezes ela se distraía com uma música ou com uma simples traição do pensamento que a devolvia a ele. Ele que ela tanto fugiu durante meses ainda estava ali guardado, esperando. Lembrar doía e ela morria um pouco a cada vez que se deixava trair pelo pensamento.
Um dia ela se entregou. Reviveu tudo o que tinha acontecido, e sofreu, e chorou, e ouviu a música deles, e as outras músicas, aquelas bem tristes. Leu aquele romance tão evitado. E viu aquele filme em que o mocinho descobre que não pode viver sem a mocinha e volta pra ela. E esperou ele voltar. E ele não voltou. E ela teve que seguir. E seguiu.
Agora ela não ignorava mais a dor, aprendeu a conviver com ela. Até se acostumou com ela. Se apegou. Tratou de nutri-la, de deixá-la forte, indestrutível (era uma forma de não perde-lo por completo).
Mas ela sabia que algo muito bom aconteceria e um dia meio sem querer ela o encontrou. Era mias alto do que o que ela se lembrava e mais bonito também. Os olhos eram ainda mias brilhantes. O cheiro? Ah, esse ela nunca tinha esquecido e ele continuava igual; cheirava a amor. Um amor puro, jovem e inocente. E como num despertar de um sono profundo ela percebeu que ele (aquele por quem tanto sofreu) já não existia, havia morrido em algum lugar do passado, e ela tão entretida em cuidar da sua dor, nem havia percebido. Ela sorriu. Ele sorriu. Os dois seguiram em direções opostas. Ela sorriu sozinha. E parou de doer.
Dizem que ela anda por aí, feliz. Aprendeu a não ignorar a dor, senão ela permanece. Aprendeu também a não nutrir a dor senão ela também permanece. Aprendeu que a vida tem muito a oferecer quando se está com o coração limpo (ela limpou o dela).
Ela sabia que ia passar. E passou!
Jordânia Azevedo
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